quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Jogos da eternidade

Paris, 1819

Os dois se enfiam em um beco escuro e sujo dando risadas altas de excitação. O barulho das rodas das carruagens ressoa ao longe. A rua é deserta e a noite é escura e indiferente, regada apenas a luz fria da lua cheia, dando um ar de suspense e de sordidez.
O homem agarra esta mulher e prensa furiosamente contra a parede de tijolo descascado, sufucando-a com os beijos desesperados que invadem e tomam sua boca. Os lábios brigam por espaço e a euforia de ditar o movimento, que naquele momento era tudo menos sincronizado. Como se cada um quisesse algo com aquilo. Esta interrompe o contato algumas vezes para soltar entre seus lábios grossos e rubros lamúrias e gemidos roucos que eram ignoradas por ambos. A mão desta mantem-se apoiada na parede e no rosto cálido do rapaz tentando, quase inutilmente, manter-se em equilíbrio sobre as suas investidas violentas. Esse possue uma das mãos no rosto enquanto os dedos enrroscam-se nos diversos laços do espartilho apertado. Os beijos do rapaz, como se cansados pela monotonia da boca, descem lentamente pelo seu rosto, navegando a língua pelo queixo, descendo carícias pela garganta rouca até chegar ao pescoço quente. Esta pende a cabeça para trás e fecha os olhos desejosos ao toque. Os olhos do moço que permaneciam fechados abrem-se repentinamente e um sorriso maquiavélico aparece em seu rosto. Ele praticamente engloba sua boca ao redor do seu pescoço e suga de leve a pele branca da li. Ambos estremecem. A boca se abre lentamente deixando os longos dentes a mostra. Finos e ardilosos, como o fio da mais rápida adaga, que penetra o peito do inimigo.
Ele continua a movimentar a boca pelo pescoço pulsante que cheira a vermelho e pulsa a vida, passando-lhe a língua que, tentadora, clama por sentir o gosto sanguinoso. Segura o pescoço desta com força, imobilizando-a,enquanto, lentamente vai fincando na carne quente os seus caninos finos. Como uma maçã, vermelha e suculenta, que é colhida precocemente do galho e partida em uma tarde de verão. Delicada e tentadora. Ela, entre os pasmos de horror e tentativas inútes de se livras da boca que a suga, grunhia dolorosamente enquanto o sangue rubro trocava de corpo. O olhar permanece estático e agonizante, como se percebesse tarde de mais o erro que cometera.
O sangue ainda quente deposita-se no canto dos lábios do outro. Um breve momento de satisfação. A moça ainda continua imóvel, mas agora um tom pálido toma a pele fria. Ele a solta repentinamente e o corpo inerte vai-se ao chão com força. Sem movimento, sem respiração, sem sangue, sem vida. Ele permanece a encarar o corpo mole que jazia no chão fétido. Abaixa-se e inala aquele cheiro de morte recém formada. Um prazer inebriante que a eternidade trouxera junto.
Ele enxuga a boca vermelha com o anti-braço do casaco escuro e sorri satisfeito. Olha uma última vez para a moça e as marcas que ainda continuam rubras em seu pescoço. Pobre alma. Tão fácil. E a vida, tão frágil. Sai do beco tranquilamente, olhando para os lados à procura de mais uma vítima, mais uma refeição fácil, que se entregue ao seu jogo de sedução.

Um comentário:

Lucas Madi disse...

Nossa, deu arrepio até.
To impressionado até agora.
Ta ótimo o conto!